Quando o outro só enxerga o próprio umbigo...

Pra sua tortura passar você trama armadilhas para prender o outro e fazê-lo apodrecer junto a você, como se isso fosse alcançar a felicidade.
Quem dera as pessoas soubessem dar valor à felicidade.
Quem dera as pessoas soubessem ser feliz.
Prisões paradisíacas iludem parcialmente. Quando as grades se mostram basta uma brecha pra sua presa fugir de vez.
A desilusão do paraíso é anestesiante.
E o cansaço desse amor tão desgastante gera solidão. E essa solidão passa a ser regada com alegrias modestas e um certo esforço que te fazem dormir sem querer acordar. Mas um dia despertas e vês que passou. Que a alegria agora domina e que estás pronto para viver um novo amor.
A questão é: demora muito pra acordar?

Existência

Tutti fruti. Tinha gosto de tutti fruti. Ou chiclete. Como queiram. E o cheiro? Ah, o cheiro adocicado que saia de sua boca e vinha perambular no meu olfato surge como a primavera. A primavera é tutti fruti! É arco-íris. E arco-íris é tutti fruti. Tutti fruti é infância. E na infância tudo é bom e está bem.
Adolescência. Pré é cereja. Cereja lembra tutti fruti. Cereja lembra pirulito. Não brinco mais de fazer bolas e estourar e ficar com a cara melecada. Agora eu chupo. Agora eu tiro o doce da boca e só recoloco se tiver vontade. Se não tiver jogo fora. Ou guardo na geladeira. É sempre bom ter um pirulito na geladeira. De conserva. Aumenta o ego. Durante a crise identitária é menta, hortelã. Arde. Refresca. Arde. Refresca. Cereja? Perdeu a graça! Agora é causar arrepios. Calafrios.
Pós. Adulto. Adultério. A menta tem seus encantos. A pimenta tem suas verdades. Queima! A cereja é esquecida. O tutti fruti tenta ser resgatado. Inutilmente. Vem. Sai. Entra. Fora! A pimenta se humaniza. Os sonhos são esquecidos. Meus sonhos são imortais. Os sonhos do tutti fruti, da cereja, da menta e da pimenta querem flutuar. Doces, amargos querem me resgatar. Meus sonhos morrem nas asas da borboleta de seda azul que eu queria me tornar.